sexta-feira, 27 de maio de 2011

Primeira homilia de Dom Emanuel Messias como Bispo de Caratinga


Meus irmãos e irmãs, por desígnio de Deus, agora, filhos e filhas queridos, ovelhas do meu rebanho. A minha já saudosa diocese de Guanhães, meu primeiro amor, fez um gesto lindo na festa dos seus 25 anos comemorados com grande solenidade, no primeiro dia deste rico mês de Maria, a primeira missionária, levando a boa nova do amor-serviço a sua parenta Isabel. Foi a cerimônia do envio, pois o lema daquela querida diocese é: ”Discipulos missionários a caminho”. Gesto forte, cheio de significado, pleno de emoção e rico em beleza. Eles enviaram o seu bispo como missionário para a Diocese de Caratinga. Chego, assim, como um bispo missionário, na simplicidade, mansidão e singeleza dos missionários do Senhor, numa vontade incontida de ser um bom pastor para as minhas novas ovelhas. A saudade é grande, mas “Quem põe a mão no arado e olha para trás, não está apto para o Reino de Deus.” Filhos e filhas que acabam de ser gerados do meu coração de pastor. Nas inúmeras entrevistas consedidas, nestes últimos meses, sempre voltava  a pergunta: “Quais são os seus projetos para a Diocese de Caratinga? Veja, meu santo povo de Deus desta Igreja particular, posso eu, saindo de uma jovem diocese de apenas 25 anos e entrando numa diocese quase centenária, trazer projetos novos, sem antes pisar este chão sagrado, sem antes conhecer e respeitar a caminhada bonita desta veterana Igreja Particular? Grandes homens passaram por aqui e é na trilha deles que desejo caminhar. Como bom mineiro já comecei a descobrir as belezas, as grandes iniciativas e os grandes passos que esta Igreja já deu, e, devagarzinho, conversando com cada padre, com cada seminarista, religiosos, religiosas, leigos e leigas, vou me inteirando da caminhada feita e onde preciso colocar ênfase, fazer resgate, insuflar novo espírito, colocar sangue novo. Estive descobrindo as marcas indeléveis dos bons e santos pastores que o Pai, rico em misericórdia, já enviou para esta Igreja Particular ao longo destes 95 anos de caminhada diocesana. Acho importante mencionar seus nomes e salientar rapidamente seus pontos fortes.
Dom Carloto
Dom Carloto Fernandes da Silva Távora (1920-1933). Treze anos de belíssimo trabalho apostólico e evangelizador, sobretudo, missionário.  Foi realmente um bispo missionário. Apesar de ser de família importante, vivia num total e encantador desprendimento. Nem casa tinha. Onde era a casa do bispo? “Onde havia um coração a consolar, uma dor a aliviar, uma iniciativa a sustentar, uma fatiga a partilhar, uma obra de caridade a fazer, uma alma a salvar; aí é a casa do bispo” escrevia alguém no jornal “O Lutador, de 22/12/1929. Vestia uma batina surrada de padre e permanecia meses em paróquias sem padre, atendendo aos fiéis, deixando Caratinga por conta do Monsenhor Aristides Rocha. Acolheu  e apoiou  o Padre Júlio Maria, sendo considerado co-fundador dos Missionários Sacramentinos de Nossa Senhora. Sua simplicidade e seu sorriso ficaram gravados no coração do povo.
Dom José Maria Parreira Lara (1935-1936). Um ano e oito meses a serviço da diocese. Rifou o automóvel dele para pagar as contas da construção da nova catedral, que foi obra incansável do Monsenhor  Rocha, que a construiu em apenas quatro anos, naturalmente, com o apoio inegável de Dom Lara, que conseguiu benzê-la com grande solenidade, em 1935. Foi o bispo dos pobres e das criancinhas. Impecavelmente vestido à maneira episcopal, de cruz peitoral e solidéu, mas com simplicidade evangélica, gostava de jogar gude com as crianças. Foi também chamado de “O bispo da caridade”. Não conseguiu visitar todas as paróquias, morrendo de febre  tifo, quando visitava Mutum.
Pe. Júlio Maria De Lombaerde, sdn
Dom João Batista Cavati. (1938-1956). Nasceu no Espírito Santo e foi Missionário Lazarista Com um ótimo currículo, com Teologia na França, era homem de grande cultura e ao mesmo tempo de profunda humildade. Dezoito anos de dedicação exemplar. Na sua Carta Pastoral de Saudação, já sonhava com o futuro Seminário de Caratinga. Sempre preocupado com a educação, foi o bispo das escolas católicas e das Vocações Sacerdotais. Sua presença foi marcante na educação da juventude e na catequese. Preparou a criação do Seminário e construiu o Palácio Episcopal. Foi o co-fundador do Instituto das Missionárias de Nossa Senhora das Graças (Gracianas). Deu um forte apoio aos Missionários Sacramentinos de Nossa Senhora, quando faleceu o fundador, Pe Júlio Maria Lombaerde. Foi ele também que trouxe para Caratinga os Padres Carmelitas descalços. Já bispo emérito escreveu o livro “História da Imigração Italiana no Espírito Santo.” Grande bispo!
Dom José Eugênio Corrêa. ( 1957-1978). Vinte e um ano à frente da diocese. Super-animado com a catequese. Inventou, antes do Concilio as “Conferência Religiosas Populares”, que se transformaram depois nos famosos “Grupo de reflexão” . Foi o bispo do  Concílio Vaticano II. A ele se deve a construção do Seminário Nossa Senhora do Rosário. Foi quem promoveu o “aggiornamento”, a renovação da Igreja diocesana de Caratinga, criando  os vários Conselhos e dando  voz  e vez  aos leigos. Incentivou o trabalho das Comunidades eclesiais de BaseFoi um grande amigo de seus padres. Interessante que deixou a diocese bem antes dos 75 anos, dizendo com toda simplicidade e sabedoria: “Depois de 21 anos de trabalhos aqui, achei melhor ceder o lugar, para que venha um bispo mais jovem, mais capaz, diferente, para corrigir talvez algumas coisas, para dar um impulso novo, uma vida nova à Diocese, para fazer o que não fiz.” Grande humildade e grande abertura para o novo.
Dom Hélio Gonçalves Heleno. Continuou as Assembléias Diocesanas de Pastoral, praticamente, uma por ano. Elaborou diversos Planos de Pastoral. Reorganizou e atualizou com muita competência todos os arquivos da Cúria em livros e pastas de documentos, acrescendo, sensivelmente, o acervo histórico de cada paróquia. Valorizou muito a Catequese, a Pastoral Familiar, a Pastoral da Criança, a Pastoral da Juventude, a Pastoral Litúrgica, Vocacional e as CEBs. Deu atenção especial ao Seminário Diocesano Nossa Senhora do Rosário, do ponto de vista físico de remodelação e ampliação, como também melhorando o nível acadêmico das aulas com professores especializados, de fora, e preparando também seus padres, conseguindo que três fizessem o mestrado em Roma. Dom Hélio carrega a glória de, com algumas poucas exceções, ter ordenado todos os padres da sua diocese. A ele se deve também a criação de inúmeras paróquias, todas providas de padres. Fez diversas visitas Pastorais em todas as paróquias, atividade que realizava metodicamente de quatro em quatro anos. Com seu grande amor pelas vocações entrega ao seu sucessor quarenta e três seminaristas, com três diáconos. Deixou a Igreja Diocesana bem organizada do ponto de vista administrativo e pastoral. Parabéns, meu querido Dom Hélio, pelo empenho apostólico neste trinta e dois anos de serviços prestados à Igreja diocesana de Caratinga.
Queridos filhos e filhas, este cuidado de repassar sucintamente a grande obra destes gigantes da fé e da sua dinamicidade apostólica, não foi apenas pelo gosto de uma retrospectiva histórica, mas para deixar claro o desafio diante do qual me encontro ao assumir esta diocese com caminhada tão bonita e por onde passaram homens sábios e profundamente dinâmicos. Diante desses traços marcantes: missionariedade, zelo pelas crianças e amor para com os pobres; empenho na educação, investimento na Juventude, sobretudo estudantil e universitária; dedicação à Catequese; vivência profunda do Concílio Vaticano II e seus desdobramentos nas diversas Conferências episcopais Latino americanas e caribenhas, como também, nas Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil; dedicação às CEBs (Comunidades Eclesiais de Base); carinho especial pelos padres, religiosos e religiosas como também aos seminaristas, vocacionados e vocacionadas; atenção especial ao seminário, à família, à liturgia. Diante de tudo isso, precisaria eu trazer no bolso novos projetos? Tentar, com a graça de Deus, por sangue novo nesta diversidade de trabalhos, já seria um grande desafio.
É verdade trago novas idéias, mas estas idéias serão sem pressa aquecidas no caldeirão das observações, das críticas e contribuições dos meus padres antes de virarem projetos. Desejo que todos participem; gosto das decisões comunitárias sempre que possíveis. Farei tudo para vivenciar no meio de vocês e ajudar vocês também a colocarem em prática  o que ouvimos na segunda leitura, em Col.3,4-12. Quero revestir-me de sentimentos de compaixão, bondade, humildade, mansidão e paciência. Quero que nosso perdão seja tão generoso e corajoso como o do Bom Pastor, fazendo-se Cordeiro Imolado ao dar sua vida, na cruz, por nós, perdoando até mesmos os que o assassinavam. Quero ver a paz e a gratidão no coração do meu povo. Quero me envolver com as crianças da Pastoral da Criança, passando pelos catequizandos da iniciação eucarística, os adolescente e jovens da crisma, as diversas pastorais da juventude, a família, os sem família, os separados, os viúvos e viúvas até aqueles que, por graça, acumularam juventude, chegando à idade madura, os da Pastoral da Terceira idade. Desejo dar uma atenção especial aos enfermos, nos hospitais ou em casa, aos irmãos com deficiência, sobretudo mental, reconhecendo neles a presença de Jesus. Também os que estão totalmente à margem terão nossa atenção, com a graça de Deus. Quero ser o bom pastor entre as minhas ovelhas, defendendo-as dos ladrões e assaltantes e conduzindo-as a verdes pastagens. Meu desejo não é exercer uma autoridade que manda, mas, obedecendo a etimologia da palavra, uma autoridade que faz aumentar. Aumentar a harmonia e a paz, aumentar a participação de todos em tudo, aumentar a misericórdia e o perdão, o bem estar e a vida de todos. Nada desejo impor, mas propor. Depois, sim, as idéias, se  aceitas,  poderão virar projetos.
Tudo isso é um desejo ardente do meu coração acanhado e pobre, mas que pretende estar aberto a todos, numa atitude constante de serviço na intimidade profunda do Bom Pastor, que conhece suas ovelhas e dá a vida por elasQuero ser a porta, que simboliza ternura, carinho e misericórdia por onde todos possam entrar e conhecer a imensidão da misericórdia do Bom Pastor. Quero ser o aconchego e a segurança das minhas ovelhas, na noite escura, dentro do redil, vigiado pelo Bom Pastor. Quero, ao raiar da aurora, conduzir meu rebanho para verdes  e saborosas pastagens. Hoje falo assim como projeto de vida, mas gostaria que vocês me conhecessem no temor e tremor antes de aceitar o ministério episcopal, conhecessem a minha pequenez e o reconhecimento que tenho pela soberania do Bom Pastor.
Para vocês perceberem a situação  interior do meu coração simples e acanhado, trago, pela primeira vez a público, uma oração angustiante, mas cheia de fé que pronunciei, abrindo meu coração ao Bom Pastor, quase dois anos antes da minha eleição para bispo, quando apenas boatos se ouviam, mas cada vez mais intensos. Curiosamente, naquela ocasião, eu já me dirigia ao Bom Pastor. Hoje,  me encontro em situação semelhante, mas, naturalmente, um pouco mais amadurecido e menos inseguro. Para que ficasse uma oração reservada, e para ser rezada mais vezes, a escrevi criptografada em caracteres gregos. Esta oração foi feita no dia 27 de abril de 1996.
Eu estava diante do sacrário:  “Jesus, estou diante de vós. Acredito profundamente nesta verdade, que estais aí, no sacramento da Eucaristia. Sei, ó Bom Pastor, que sois o meu Bom Pastor. Tenho experimentado, , uma solicitude, uma ternura da vossa parte que me deixam sem jeito, até envergonhado. Vejo a vossa mão me amparar até mesmo nos meus erros. Não vejo repreensão, não sinto cobranças. Vejo apenas amor, carinho, ternura, amparo. Sei que não mereço. Sei que não é pelos meus méritos, que agis assim. Assim o fazeis, porque me amais apaixonadamente.  Sois o amor.
Jesus, compreendo, profundamente, vossas atitudes. O que não compreendo são as minhas! Por que não sou mais agradecido? Por que não sou melhor? Por que não correspondo mais? Sou tão pequeno para cuidardes de mim, com esta ternura desconcertante,  sou tão insignificante para me dardes tanto valor!
E agora,Senhor, aquele último sinal! Se  vem de vós, é por amor. Eu sei. Mas estou confuso, Senhor; muito confuso! Receio não conseguir dizer sim. Não me posso imaginar em tal situação. Vós me conheceis, ó Bom Pastor!. Para mim está claro que não é este o meu caminho. Mas como duvidar que é um chamado que vem de vós? E se vem de vós, como pode ficar obscuro para mim? Não sei! Perdi meu chão! Lembro-me de Moisés; lembro-me de Jeremias. Mas como comparar-me a estes gigantes da fé? Até este pensamento é imbecil. Eles foram homens de grande intimidade com vosso Pai. Eu me sinto muito pequeno, muito distante, muito imperfeito.
Ficai comigo, Senlhor!, juntinho de mim. Sou uma criança insegura e a cidade está muito movimentada! Segurai minha mão, Senhor! Sede meu Pastor. Se me largais, eu serei atropelado. Dai-me serenidade nesse tempo, ó Bom Pastor! Mas ... prefiro estar enganado. Não gostaria que fosse verdade, o que estou percebendo. Se for, ó meu Amado, que não seja por agora. Que demore a chegar; que demore muito! Preparai-me, Senhor, como preparastes Isaias, purificando os seus lábios. Ainda preciso caminhar muito.
Jesus, meu Bom Pastor, vós me conheceis por dentro e por fora! Sabeis que estou sendo sincero. Ajudai-me!  Estou confuso, embora sinta que nasci para servir. Amém. “
Por causa dessa confiança imensa e intimidade profunda com o Bom Pastor, pelo fato de sentir a cada momento seu amor misericordioso para comigo, posteriormente, já bispo eleito, quando um amigo me perguntou qual seria o meu lema, respondi, sem tergiversar: “A serviço da misericórdia.”
Agora, vocês compreendem por que enumerei os insights, as grandes inspirações e realizações dos meus antecessores e por que quero chegar de mansinho e pisar cheio de reverência o chão sagrado desta admirável diocese.  Os que me precederam foram grandes homens, fizeram coisas maravilhosas. Eu sou um pequeno pastor de ovelhas, mas acredito que o Senhor me enviou até vocês para que, na humildade e simplicidade, eu dê continuidade a tantas maravilhas que o Senhor conseguiu realizar em favor desta já amada diocese de Caratinga, através daqueles que por aqui passaram.
Que possamos educar nossos ouvidos para reconhecer a voz do Pastor. Quem conhece o evangelho, sabe, hoje, distinguir a voz do pastor manso e  humilde, diante de tantas vozes, que ressoam por toda parte, violentas e prepotentes. Que a minha disponibilidade, o meu coração aberto e oblativo, meu desejo imenso de estar a serviço, de ser pai, irmão e amigo de todos e todas, possa encontrar respaldo nas orações incessantes de todos os meus queridos irmãos no episcopado e no sacerdócio, religiosos e religiosas, leigos e leigas consagrados, seminaristas e vocacionados, povo santo de Deus desta  amada Diocese de Caratinga. Louvado seja o Bom e Belo Pastor de todos nós. (Fonte: Diocese de Caratinga)

Um comentário:

  1. eu gostaria de conhecer a historias destes bispos e quais as principais obras feitas por eles
    Aguardo Resposta

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