Peço aos queridos sacerdotes lerem esta introdução: nada de novo lhes ensinará, talvez, porém relembrar-lhes-á umas verdades práticas que facilmente ficam sepultadas no esquecimento.
I – Razão de ser deste trabalho
Um comentário apologético do Evangelho Dominical é quase uma novidade nas homilias, tanto estamos acostumados a ver apenas: comentários literal, dogmático e moral.
Em tempos idos, tais comentários eram suficientes, porque as crianças recebiam dos pais a instrução necessária para firmar sua fé e não deixar dúvidas em seu espírito. Deste modo, podia o sacerdote enxertar, sobre estas noções, comentários evangélicos, dogmáticos e morais, que eram compreendidos porque encontravam alicerces.
Hoje, infelizmente, estamos numa época de ‘falta de tempo, de gesto e de espírito religioso produtivo’, de modo que raros são os pais que ensinam a doutrina católica a seus filhos; uma mãe cristã ensina ainda a rezar, ministra-lhes umas verdades fundamentais, porém, muitas vezes de modo superficial, mal assimilado, feito às pressas, sem deixar uma convicção sólida no espírito da criança.
Este trabalho fundamental e básico da convicção tem que ser feito pelo sacerdote, no púlpito, nas homilias do Domingo ou no catecismo de perseverança.
Para muitos, a religião é uma espécie de opinião, iguais às opiniões sociais ou políticas: tomam o que lhes agradam, rejeitam o que não agrada e duvidam de uma doutrina que mal conhecem.
Para reagir contra esse abuso e retificar esta idéia falsa de religião, é preciso preparar a inteligência e a vontade para a aquisição de um espírito de fé, mais intenso e mais ativo. É tal preparação que se faz pela Apologética.
II – O que é Apologética?
É a demonstração da verdadeira religião contra todos os seus adversários, quer sejam incrédulos, quer sejam heréticos.
O grande ponto de controvérsia está nesta questão: É ou não é verdade a doutrina da Igreja Católica?
Esclarecidos pela fé, nós católicos respondemos: Sim, é a pura e imutável verdade!
Mas os adversários tem o direito de pedir provas de uma afirmação tão categórico.
Estas provas são dadas pelo ensino apologético.
Há no mundo um fato público, visível e inegável para todos: é a existência da Igreja Católica, que ao longo dos séculos proclama bem alto: Eu sou a única Religião Verdadeira! Aquele que crer em mim se salvará. Aquele que me rejeitar, será rejeitado por Deus!
Para nós, católicos, tal verdade não se discute: é de absoluta certeza. Infelizmente, há alguns que ignoram e outros que negam tal verdade.
A uns e outros a apologética dá uma resposta. Tal resposta, para ser completa, deve apresentar três partes em sua demonstração:
1) O fundamento
2) Os meios
3) Os fatos
O fundamento compreende:
- A existência de Deus
- A Imortalidade de Deus
- A Providência Divina
- A Lei Natural
- A necessidade da religião
Os meios de demonstração são: os milagres e profecias, provando que a religião cristã foi divinamente revelada, e divinamente provada pelos milagres.
Os fatos são:
- A existência da religião cristã
- A sua admirável história
- A sua preeminência sobre as demais religiões
- A aplicação das profecias
- Os milagres do antigo e novo testamento
Uma vez provado que a religião cristã é a única religião divina, torna-se fácil provar que essa única religião é conservada e ensinada pela Igreja católica, tendo, ela só, inscritos na fronte os característicos de Jesus Cristo.
Nesse novo quadro vem agrupar-se sucessivamente:
- Os erros das seitas dissidentes,
- O papado no Evangelho
- A necessidade da infalibilidade
- A hierarquia da Igreja
- O Papado e a Eucaristia
É tudo isso que vamos por nessas instruções apologéticas.
III – O preâmbulo da fé
Os teólogos chamam a Apologética o preâmbulo da fé. Vejamos a razão e a certeza desta denominação.
Muitos pregadores queixam-se da inutilidade de seus sermões e conferências. Pode haver nesta queixa muita humildade, que ignora o bem produzido, pode haver também muita verdade.
Estará, talvez, o assunto bem adaptado às necessidades do presente? Estamos atravessando uma crise de caráter e, portanto, de fé.
A fé, embora sincera, é muitas vezes fraca, vacilante, porque não tem base. A fé é uma virtude sobrenatural, porém, no homem, o sobrenatural está como enxertado no natural.
Faltando a disposição natural na pessoa, o sobrenatural não encontra base sólida, e afora um milagre, não se sustenta. É fácil analisar isso. Basta analisar o ato de fé.
A fé completa percorre três etapas:
- A credibilidade (é crível)
- A credidade ou conveniência (convém crer)
- A fé propriamente dita (creio)
A fé deve apresentar-se com títulos sérios ou credenciais, que mostram que esta ou aquela verdade é crível: são os motivos da credibilidade.
À vista destas credenciais, o espírito convence-se especulativamente de que deve crer em tais verdades críveis: é o assentimento de simples credibilidade.
Depois, saindo da ordem teórica, o espírito passa à determinação prática, e diz: Se tal coisa é crível, convém, pois, crer! São os atos de credidade.
A vontade, então orientada pela inteligência, faz o ato livre de fé: É crível, convém crer, creio!
IV – O ato de fé
Estes três atos que acabamos de assinalar encadeiam-se, e não podem ser separados.
Para que a fé penetre numa alma é preciso recorrer aos motivos que iluminam a inteligência e estimulam a vontade: são os motivos de credibilidade.
Os motivos de credidade são uma espécie de impulso dado à vontade para crer: convém Crer!
A vontade tira a conclusão e diz: creio. – é o ato de fé.
A graça divina intervém nestas várias operações para iluminar a inteligência e inspirar a parte afetiva; ela é menos necessária talvez para a credibilidade, mas absolutamente necessária para a credidade (convém crer) e para a adesão final: creio.
O motivo da fé é a autoridade de Deus revelador; o meio ordinário e a regra comum é a autoridade da Igreja.
Pode-se comparar essas três etapas da fé às três etapas da impressão de um livro.
- O censor do livro diz: nihil obstat. É bom, não há impedimento.
- O Bispo diz: Imprimi potest: pode ser impresso...
- O autor, entregando o livro à tipografia, tira a conclusão e diz: Imprimatur. Seja o livro impresso.
Em suma, esses três atos são: É bom – Convém – faço!
Assim o homem ouvindo uma exposição apologética, aprende os motivos de credibilidade: É crível. A sua vontade instruída diz logo: Creia pois! (credidade) e, estimulada pela graça e pela inteligência, a vontade exclama: Creio, Senhor!
V – Necessidade da Apologética
Bem compreendido o que acabamos de dizer do ato de fé integral, podemos, com segurança, tirar uma conclusão de grande alcance.
A falta de fé sólida e convicta é o grande mal da nossa época.
É preciso, não simplesmente ensinar a doutrina, o dogma, a moral: é preciso, antes de tudo, argumentar e fundamentar a fé.
Ora, o caminho desta fé integral é o que já chamamos – introduzir nos espíritos os preâmbulos da fé.
Estes preâmbulos são a Apologética, contendo:
- Os motivos de credibilidade, mostrando as raízes, as belezas, os atrativos, o lado racional das verdades religiosas: é preciso mostrar que a religião é crível.
- É preciso deduzir destas noções a necessidade de abraçar e praticar esta religião, pelos motivos de credidade ou conveniência. Se a religião é crível, convém crer nela.
- Só depois desse preparo do espírito e da vontade haverá um ato de fé integral, baseado de um lado sobre o conhecimento da religião, e de outro lado sobre a autoridade de Deus, revelador da Religião.
Assim sendo, o primeiro ensino a dar aos fiéis é o ensino apologético: donde a necessidade de um curso completo sobre o assunto, durante o ano inteiro, na pregação dominical.
VI – Conclusão
Concluímos que o presente curso de Apologética é de incontestável necessidade, para preparar as almas ao dom da fé, que lhes mostra a religião, não mais como uma simples opinião, mas como uma verdade revelada por Deus.
A exposição dessas verdades, longe de ser árida, como uns pensam, excita nos ouvintes um imenso interesse de conhecer melhor a religião e de praticá-la integralmente.
Fruto de longa experiência no púlpito e na administração paroquial, o presente livro não tem outra ambição senão de ajudar os zelosos sacerdotes no desempenho de sua atrelada e às vezes espinhosa missão de instruir os fiéis e de excitar neles uma fé sincera, fundada e ativa.
Nada de novo ensina, é certo, aos sacerdotes, porém coordena, divide, adapta e deduz do Evangelho, numa ordem lógica, umas tantas verdades, que não se nota à primeira vista, mas cuja explanação relembrará aos pregadores o que sabem e lhes mostrará o modo prático de expor estas verdades ao povo.
Seja este livro nas mãos do nosso clero zeloso, um instrumento para a salvação das almas, é a única aspiração do autor.
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