terça-feira, 1 de março de 2011

O Segredo da Verdadeira Devoção [V]

CAPÍTULO II

O CULTO DE MARIA

Devemos honrar Maria Santíssima: ninguém pode duvidar disto. Nossos irmãos separados da verdade católica, os protestantes, têm sido bastante ilógicos recusando à Mãe de Deus a honra e o louvor que sua dignidade e suas virtudes exigem.

O culto de Maria está baseado em razões tão transcendentes, que quem sabe e procura refletir prostra-se necessariamente aos pés desta sublime criatura, para redizer, ou, melhor, para realizar a grande profecia que o Espírito Santo pôs nos lábios d’Ela um dia: – “Beatam me dicent omnes generationes” – “Todas as gerações me proclamarão Bem-aventurada!”.

I. Dignidade de Maria

Devemos honrar Maria Santíssima. Somos-lhe devedores de um culto, que, embora infinitamente inferior ao que prestamos a Deus, é completamente superior ao que é devido a uma simples criatura.

Maria é uma criatura exaltada, glorificada, Bem-Aventurada mais que todas as outras, elevada a uma dignidade quase infinita.

A maternidade divina, de fato, pertence a uma ordem à parte, chamada Ordem Hipostática, e tem com esta ordem uma relação necessária”, diz o grande teólogo Suarez.

Santo Tomás chega a dizer: “A dignidade de Mãe de Deus é uma dignidade infinita” – “Beata Virgo, ex hoc quod est Mater Dei, habet quamdam dignitatem infinitam, ex bono infinito quod est Deus.” – Summ. I part. XXV. Art. VI.

Pois a esta dignidade, única em sua espécie, corresponde um culto, único também: o culto de hiperdulia que a Igreja só presta à Virgem Santíssima.

Mas não basta honrar Maria... como também não basta somente honrar a Deus.

Contentar-se em prestar a Deus somente um culto de louvor seria cair no erro protestante, que coloca a salvação apenas na fé e ensina que basta crer em Deus e louvá-lo, para ser perfeito cristão.

O bom senso já fez justiça a essas asserções luteranas. Crer é o alicerce; o edifício são as obras. Querendo construir um edifício, quem se contenta só com os alicerces?

A fé é uma semente lançada em nossa alma.

Mas toda semente é destinada a germinar, a crescer e produzir flores e frutos. Do mesmo modo, a fé deve crescer e produzir frutos, que são as obras da justiça. Não é somente a fé que salva, mas as obras produzidas pela fé.

Este raciocínio se aplica tanto ao culto devido a Jesus Cristo quanto ao culto devido à Maria Santíssima. Devemos um culto à Mãe de Deus. É a semente. E esta semente deve produzir flores e frutos. Isto é, este culto deve manifestar-se por obras.

Continuando a comparação, digo que é a flor que vamos presentemente estudar, reservando para um outro estudo “o fruto bendito”.

Qual é esta flor, e qual é este fruto?

A Flor do culto de Maria é o Dom de si mesmo a esta boa Mãe.

O Fruto é a Imitação de suas virtudes.

A prova é de fácil compreensão para todos, e serve de base a toda a Mariologia.

II. Lei Circular

Existe na religião católica uma lei fundamental, chamada pelos teólogos: lei circular. É ela que preside a tudo e tudo explica. Esta lei é o dom de si.

Como dizem os teólogos, é uma lei circular: Deus se dá ao homem; o homem deve dar-se a Deus.

Tudo procede de Deus; tudo deve voltar para Ele.

Deus se deu a nós, para nos mostrar como devemos dar-nos a Ele.

E como foi que Ele se deu a nós?

Por Maria.

Como devemos dar-nos a Ele?

Por Maria.

Em Maria está, pois, a mais bela aplicação desta “lei circular”.

Por meio d’Ela, “o dom” vem do alto do céu à terra; e, ainda por meio d’Ela, volta da terra para o céu.

É o papel mediador de Maria entre Deus e os homens. Por criação e por natureza, somos de Deus e para Deus. E Deus quer que, por nossa espontânea vontade, renovemos este dom de nós mesmos, na forma por ele prescrita.

Ora, Ele se deu a nós Por Maria. Logo, Ele quer que, nos demos a Ele também Por Maria.

Deste modo, o dom de si é verdadeiramente uma flor, que desabrocha sobre a haste do culto da Mãe de Deus.

A flor desabrocha antes do fruto. Não é, pois, o fruto. Mas, sem ela, não haveria fruto; seria a esterilidade.

Para darmos ao culto de Maria toda a força e toda a expansão, para recolhermos desta bela haste o desejado fruto da virtude e da santidade, é preciso que façamos desabrochar a flor.

Em outros termos:

Para dignamente honrarmos à Virgem Santa, como Deus quer que Ela seja honrada, é mister que nos demos a Ela, e, por Ela, a Jesus Cristo, seu filho. Sem isto, sem este dom espontâneo e voluntário, a graça divina não circulará em nossas almas; mais abundante e mais ativa, para nos facilitar a reprodução dos exemplos do Salvador, de quem a Virgem Imaculada é a cópia suave e sem mancha. É o que queremos estudar nestas páginas.

* * *

Firmados nos princípios mais sólidos da teologia e nos ensinamentos dos santos, faremos todo o possível para ficar sempre ao alcance de todas as inteligências.

Entretanto, cumpre notá-lo, para serem bem compreendidas e bem apreciadas, estas páginas exigem uma leitura repetida.

Não basta lê-las de um só folego; é preciso relê-las, meditálas, assimilá-las.

Para as almas piedosas, que buscam a perfeição, elas hão de ser um feixe luminoso, hão de descortinar-lhes aos olhos um horizonte talvez desconhecido, e, ao coração, um verdadeiro segredo, o segredo do amor à Santíssima Virgem.

Mas torno a repetir: Estas páginas se dirigem às almas sérias, piedosas, ou, ao menos, desejosas de o serem. Às que são frívolas, elas ocultarão o segredo... Porque em almas que são como a terra das estradas, não pode germinar uma semente divina, disse Nosso Senhor – Mt 13, 18.

Felizes os corações que tudo compreenderem!...

E mil vezes mais felizes os que a praticarem com fervor!...

Os anjos hão de inclinar-se, radiantes e alegres, reconhecendo nestes corações justos a imagem e o sorriso de sua Rainha celestial.

III. Divisão geral

É nosso dever honrar a Santíssima Virgem. E quão suave é este dever! Já tratamos deste assunto em outro trabalho. Expusemos ali o primeiro modo de amarmos a Mãe de Deus. Mas o amor não pode parar aí; ele tem asas...

Quem ama não se contenta com honrar, mas suspira pela posse do ser amado.

E quando este ser não é um objeto inerte e sim uma pessoa, a aspiração natural do amor é dar-se a ela, ser possuído por ela.

É o segundo modo de amar a Virgem Santa.

Dar-se a ela, pertencer a ela, ser d’Ela propriedade, da maneira mais íntima e irrevogável – eis a aspiração de toda alma apaixonadamente cristã.

Mas como realizar isto?

Como identificar-nos com ela, como “perder-nos em Maria”?

Pergunta deliciosa!

Vamos dar-lhe a resposta neste estudo.

Procuraremos, por isso, entre as devoções, a que mais nos une a Maria Santíssima; e depois de encontrá-la estudaremos, até nos pormenores, os seus motivos e a sua prática.

Será assunto de todo este livrinho.

Dividimo-lo em quatro partes:

I . O DOM DE NÓS MESMOS A MARIA,

ou os diversos modos de pertencermos à Virgem Santa.

II. O DOM MAIS COMPLETO DE NÓS MESMOS,

ou a Santa Escravidão ensinada por São Luís Maria Grignion de Montfort.

III. A PRÁTICA DERIVANTE DESTE DOM,

ou a maneira de viver a Santa Escravidão, de percorrer seus vários graus, até a união mais íntima com a Santíssima Virgem.

IV. AS RELAÇÕES DA SANTA ESCRAVIDÃO

com a doutrina da Santa Igreja.

Aconselhamos a leitura de “O Segredo de Maria”, de São Luís Maria Grignion de Montfort, que servirá a um tempo de obra de consulta e base ao sistema de espiritualidade proposta pelo mesmo santo.

Um comentário:

  1. Maria...
    Só o nome, pronunciado com leveza, já é música aos nossos ouvidos.

    "Devemos honrar Maria Santíssima. Somos-lhe devedores de um culto, que, embora infinitamente inferior ao que prestamos a Deus, é completamente superior ao que é devido a uma simples criatura."

    Palavras que por si só já dizem tudo sobre essa que é nossa "mãezinha do céu".
    Parabéns! Grande abraço.

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